quinta-feira, 20 de outubro de 2016

Rio de Janeiro. Jovens empunhando instrumentos musicais como armas em favela viralizam na web.

 "Alguns lutam com outras armas." REPRODUÇÃO INSTAGAM/ANDERSON VALENTIM

Uma foto publicada pelo projeto Favelagrafia, está dando o que falar após viralizar nas redes sociais, e já registra quase 5 mil curtidas, e ainda está sendo reproduzida por vários famosos nacionais e internacionais.


Tirada pelo Fotógrafo/Músico/Estudante de Design gráfico do Morro do Borel, na Tijuca, Anderson Valentim, que integra o Favelagrafia, a fotografia mostra cinco jovens, que são músicos amigos do fotógrafo, que aparecem com os rostos cobertos e segurando instrumentos musicais como se fossem armas no Morro do Turano, no Rio Comprido, Zona Norte do Rio. Na legenda da imagem a frase "Alguns lutam com outras armas."

 "Alguns lutam com outras armas." REPRODUÇÃO INSTAGAM/ANDERSON VALENTIM


Anderson Valentim, contou nesta entrevista exclusiva para a Sputnik, que o projeto Favelagrafia teve início no Rio em julho deste ano, e é uma iniciativa da Prefeitura, através da Secretaria Municipal de Cultura, e patrocinado pelo Consórcio Linha 4 Sul do Metrô e da Agência de Publicidade, NBS rio+rio.

Segundo Anderson Valentim, o projeto tem como objetivo retratar o cotidiano das favelas cariocas através do olhar de fotógrafos escolhidos em nove comunidades do Rio: Morro do Borel, Santa Marta, Morro da Mineira, Complexo do Alemão, Providência, Cantagalo, Babilônia, Rocinha e Morro dos Prazeres. 

"Esse projeto é idealizado pela Agência de Publicidade NBS rio+rio e ela escolheu nove fotógrafos para retratar o dia a dia de cada um, com um aparelho de celular, para retratar mesmo o olhar de cada um. 

 "Anderson Valentim" REPRODUÇÃO INSTAGAM/ANDERSON VALENTIM
Todas essas fotos, o material algumas vão virar peças gráficas, um livro e vai ter uma exposição agora em novembro." Sobre a repercussão de sua foto no Brasil e no mundo, com seus amigos, que integram um grupo de jazz do Morro do Turano, no Rio Comprido, na zona Norte do Rio, Anderson se diz surpreso, pois a imagem na verdade foi uma continuação de uma linha de imagens que começou a partir de uma outra foto, que mostra um menino da comunidade do Borel segurando uma flauta e também com o rosto coberto. 

A ideia, segundo o fotógrafo era retirar a imagem que tinha ficado da comunidade, por conta de um confronto entre policiais e traficantes da favela, que tinha acontecido na ocasião, mas sem a intenção de levantar bandeiras ou causar polêmica. Anderson Valentim conta que não esperava toda essa repercussão. "Eu já tinha feito uma foto semelhante com um menino de flauta de capuz, só que ele não estava com o instrumento em punho e eu queria retratar isso. Eu senti que ele estava tímido com essa questão e eu acabei respeitando isso. 

Como eles são meus amigos de longa data, tocamos juntos há mais de dez anos eu fiz mais ou menos a proposta. E tinha acontecido um fato interessante, pois tinha sido uma semana antes daquela guerra  urbana que teve no Turano e aí fizemos a foto, mas foi uma coisa intimista, não teve a intenção explícita de falar sobre o assunto, até eu não pensei que ia gerar essa proporção, porque eu já tinha feito essa foto do menino e não pensei que ia causar esse tamanho todo que chegou. Fiquei muito surpreso."

 "Alguns lutam com outras armas." REPRODUÇÃO INSTAGAM/ANDERSON VALENTIM

O fotógrafo chama atenção para a importância de projetos como o Favelagrafia para acabar com os esteriótipos de que não há cultura ou pessoas e ações que podem se destacar de uma forma positiva dentro de uma favela. 

"Nós carregamos um carimbo muito forte, o que está reverberando é apenas 10%. 90% de coisas boas no morro feitas por uma turma que faz arte, de pessoas que estudam. No Morro do Borel tem uma menina que está estudando engenharia, talvez ela seja uma das únicas, algumas das minhas fotos eu estou sempre procurando retratar isso. Eu realmente quis chocar com essa questão sim para poder sair nos morros o que não é retratado. Eu quis trazer esse outro olhar de que também tem coisas legais no morro. A própria questão da música, nós estamos rotulados, quando se fala do morro estamos rotulados com a questão do funk ou samba, e na realidade tem os moleques tocando jazz, e isso está lá já há muito tempo e não é retratado."

Para Anderson Valetim o sucesso do Favelagrafia está na liberdade de trabalho dada aos fotógrafos escolhidos para o projeto, que normalmente não é dada nesse tipo de ação nas comunidades.

"Às vezes os projetos vêm com um formato muito quadro e não dão certa liberdade. O sucesso desse projeto é isso, em nenhum momento eu tive problema com a minha criatividade. A fala é assim: que mora no morro não está pedindo favor, é só um carinho, uma atenção, e eles deram essa liberdade. Você vê hoje uma agência de publicidade que está na correria, você pega um diretor de arte que vai no morro te ajudar.

Isso tem um peso muito grande. Os nove fotógrafos irem lá na agência ter o olho no olho, perguntar o que eles acham, essa troca é muito importante. Talvez esse projeto seja uma das melhores coisas que está acontecendo no Rio de Janeiro devido a essa questão do respeito do olhar de cada fotógrafo."

 "Alguns lutam com outras armas." REPRODUÇÃO INSTAGAM/ANDERSON VALENTIM


Através de suas fotos, Anderson Valentim diz que espera que as pessoas passem também a ter um novo olhar sobre as pessoas que vivem nas favela e deem espaço também para a cultura que é produzia nessas comunidades. 

'Espero que as pessoas tenham um novo olhar sobre as comunidades, que elas olhem a partir dessa foto com carinho. É interessante, algumas pessoas olham a primeira vista e veem o capuz e criam um conceito, só que embaixo já está o instrumento musical, então, é dar um segundo olhar, repensar, porque existem pessoas nas comunidades que precisam de oportunidades, que nossos governantes atentem para isso. Hoje eu não acredito na política armada, não acredito que eu toque na política pacificadora vai trazer paz e solução para a comunidade. Eu acredito na educação, na arte. Eu acho que esse é o caminho."

Link original; https://br.sputniknews.com/brasil/201610196591803-foto-jovens-armas-instrumentos-musicais-favelagrafia-projeto-favelas-rio-viralizam/